Maria Laurinda Adão
Data de nascimento: 03/07/1943
Mestra do Caxambu de Monte Alegre, mulher de múltiplas faces, guardiã das tradições de seu povo. Assim é Maria Laurinda Adão, misto de rainha e guerreira, uma figura sempre exuberante com seus adornos coloridos, sorriso fácil e uma vitalidade que desafia o tempo. Com seus mais de 80 anos, mantém um ritmo de atividades intenso, dividindo-se entre as funções no grupo de Caxambu Santa Cruz e as lideranças espiritual e comunitária em Monte Alegre, lugar onde nasceu e sempre viveu.
Engajada, militante em frentes diversas – da cultura popular às causas trabalhistas e de gênero –, Maria Laurinda ganhou notoriedade em todo o Estado e até fora. É referência na Comunidade Quilombola de Monte Alegre. Nascida em 3 de julho de 1943, teve uma vida difícil e sofrida, mas nem por isso renunciou à alegria de viver.
Aos 12 anos assumiu o ofício de parteira. Foram mais de 100 crianças trazida são mundo desde então. “Nunca perdi alguma”, conta orgulhosa. Ao longo de 45 anos foi a parteira oficial das localidades de Monte Alegre, Pacotuba, Retiro, Boa Esperança, Jaboticabeira, Mangueira, Morcego, Santa Joana, Santa Maria, dentre outras.
Aos 25 começou a trabalhar como coveira, de forma voluntária, nos cemitérios de Monte Alegre e Morro Seco, ofício que ainda exerce, sempre que há necessidade.
Mãe solteira de uma única filha, aos 27 anos, jamais quis se casar. O pai Paulino Adão não aceitou e a expulsou de casa. Com o tempo fizeram as pazes. Não sobraram mágoas. Hoje tem quatro netos e quatro bisnetos.
Ainda criança já participava do Caxambu de Santa Cruz, que segundo relato dos mais antigos teria nascido no dia da libertação dos escravos, em 13 de maio de 1888, por iniciativa de um ancestral, um escravo que volta e meia era castigado no tronco por sua constante rebeldia. O grupo era comandado pelo avô José Ventura.
Mas somente aos 20 anos passou a ter uma participação mais efetiva, juntamente com a mãe Eremita e o irmão Paulo Adão, então mestre. Como ambos se tornaram evangélicos, Maria Laurinda assumiu a missão de mestra e líder do Centro Espírita São Jorge, com a ajuda da irmã Adevalmira.
Por sua atuação destacada nas diversas frentes em que milita, Maria Laurinda obteve reconhecimento e notoriedade. Em 2010 foi certificada como Patrimônio Vivo de Cachoeiro. Em 2009 foi uma das vencedoras do Prêmio Mestre Armojo do Folclore Capixaba e também ganhou o Prêmio Mestra Izabel, concedido pelo Ministério da Cultura. Em 2018 foi agraciada com a Comenda Rubem Braga e, em 2023, com a Comenda Domingos Martins.
Antes disso, em 2008, foi indicada entre as mulheres que ilustram o livro “Mulheres Negras do Brasil. Está também entre as três capixabas que ilustram o cartaz da Lei Maria da Penha.
Sua importante trajetória de vida já foi registrada no documentário Todas as faces de Maria, em 2012. Posteriormente, esse projeto se transformou em um livro de mesmo nome – também lançado pessoalmente em Moçambique, na África – e em uma exposição fotográfica, que foi exibida em Vitória, Santa Leopoldina, Santiago (Chile) e Cachoeiro, sua cidade natal, entre 2014 e 2016.
Também foi uma das figuras homenageadas pela escola de samba Imperatriz do Forte, de Vitória, em 2025, com o enredo “Só quem sabe onde é Luanda saberá lhe dar valor”, desfilando na avenida ao lado de sua irmã Adevalmira.
Seu grupo organiza a tradicional festa Raiar da Liberdade, que acontece anualmente, desde 1888, no dia 13 de maio, a qual foi reconhecida, pelo IPHAN, como Patrimônio Cultural Imaterial do Espírito Santo, em 2024. “É só alguém pedir que acendemos a fogueira e começamos a brincadeira”, diz com um sorriso aberto.
É membro fundadora da Associação de Salvaguarda do Patrimônio Imaterial Cachoeirense. “É um compromisso meu. Vim para ajudar outras pessoas, aqueles que precisarem. Se for determinado por Deus, estou junto”, detalha sobre a missão de mestre. Defende que o conhecimento deve ser compartilhado. Para ela o pior defeito do ser humano é a ingratidão.
Em 2008 o Grupo de Caxambu Santa Cruz recebeu do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) o título de Patrimônio Cultural do Brasil.
Em 2024, o projeto intitulado “Trilhas do Quilombo Monte Alegre” – que reúne um conjunto de ações realizadas no local de moradia e atuação de Maria e seu caxambu – foi contemplado com o Prêmio Rodrigo Melo Franco de Andrade, a mais alta premiação na área da preservação e da salvaguarda do patrimônio cultural brasileiro.
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Fotos: Luan Faitanin Volpato